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Cientistas estudam o medo da nanotecnologia

Nanocientistas sempre sentiram certo nervosismo sobre como sua ciência é vista pela opinião publica. Esse desconforto se baseia em uma série de pressupostos acerca da reação das pessoas frente a novas tecnologias em geral. Algumas dessas suposições foram testadas por três estudos publicados na Nature Nanotechnology, que abordaram as atitudes do público em relação à ciência.

Com bastante freqüência, os cientistas tratam o público como uma massa indiferenciada. De fato, Arie Rip, sociólogo da ciência da Universidade de Twente, Holanda, chega a detectar uma “nanofobia-fobia” disseminada entre pessoas envolvidas com nanotecnologia – uma convicção irracional e exagerada de que um público ignorante cientificamente, sem interesse em pesar riscos e benefícios, vai rejeitar uma tecnologia promissora em função de meios de comunicação irresponsáveis.

Uma análise mais sofisticada precisa reconhecer que o público é formado por diferentes pessoas com suas próprias ideologias, através das quais filtram as informações sobre tecnologias e seus riscos.

Talvez a mais comum pressuposição entre cientistas é a idéia de que o temor à tecnologia surge da ignorância, e que a aceitação pública aumentará inevitavelmente à medida que as pessoas souberem mais a respeito da tecnologia. Dan Kahan, da Escola de Direito de Yale em New Haven, Connecticut, e seus colegas chamam isso de hipótese da familiaridade e demonstraram que ela é falsa.

A opinião das pessoas pode se tornar mais ou menos favorável à medida que seu conhecimento sobre nanotecnologia aumenta, descobriram os autores, dependendo de seu ponto de partida ideológico. Os chamados individualistas hierárquicos, que apreciam o livre mercado e respeitam a autoridade de elites sociais, parecem aprovar mais a nanotecnologia à medida que se familiarizam com ela. Ao contrário, mais informação parece dar aos “comunitaristas igualitários” mais razões para se preocupar.

Um oceano de diferença
Outro preconceito bem comum vê o público americano como um entusiasta da tecnologia pró-mercado, enquanto os europeus tendem a ser mais ecológicos e contrários à tecnologia. O resultado de dois colóquios públicos sobre tecnologia realizados paralelamente em Santa Bárbara, Califórnia, e Cardiff, Reino Unido refletiu sobre a questão.

Nick Pidgeon, psicólogo da Universidade Cardiff, e colegas descobriram pouquíssimas diferenças na percepção dos dois grupos. As pessoas geralmente aceitavam o potencial da tecnologia e, apesar de uma falta de conhecimento, acreditavam que os benefícios compensariam os riscos.

Mas existiram diferenças. O grupo do Reino Unido relacionou riscos potenciais da nanotecnologia a problemas regulatórios percebidos no passado; por exemplo, organismos geneticamente modificados, doença da vaca louca e febre aftosa. Também existiram contrastes entre os valores de proteção ao consumidor nos Estados Unidos e as preocupações comunitárias no Reino Unido. Por exemplo, o grupo do Reino Unido receava que os possíveis benefícios médicos da nanotecnologia favoreceriam apenas os ricos.

À luz do estudo de Kahan, pode ser tentador interpretar essas diferenças transatlânticas como conseqüência de visões políticas divergentes, com individualistas hierárquicos sendo mais comuns nos Estados Unidos e uma ampla tendência ao comunitarismo igualitário no Reino Unido. Mas existe outra diferença evidente entre os dois países – o papel da religião.

O debate sobre células-tronco mostra que o público americano não é uniformemente a favor de toda tecnologia e posturas religiosas são claramente importantes nos EUA. Dietram Scheufele, especialista em comunicação científica da Universidade de Wisconsin-Madison, e colegas sustentam que a religião também é importante para a nanotecnologia. Suas pesquisas por telefone nos EUA revelam que um alto grau de religiosidade está fortemente correlacionado à rejeição individual da afirmação “a nanotecnologia é moralmente aceitável.” No nível nacional, mais pessoas em países europeus concordam que a nanotecnologia é moralmente aceitável do que nos Estados Unidos, e os pesquisadores relacionam isso às diferenças nacionais de religiosidade.

O que é essa nanotecnologia?
Mas é válido supor, como fazem esses estudos, que existe uma coisa chamada nanotecnologia que pode ser resumida e caracterizada como moralmente aceitável ou não? Mesmo entre nanocientistas pode haver diferenças sérias sobre o que constitui a nanotecnologia e a informação disponível ao público sobre o campo é fortemente influenciada pelas ideologias de sua origem, seja os interessados nos nano-negócios, ambientalistas ou entusiastas do melhoramento humano.

Ao assumir a hipótese da familiaridade, a equipe de Kahan infligiu outro golpe ao ‘modelo de déficit’ da comunicação científica: a idéia de que, uma vez informado sobre os fatos (quaisquer que sejam), o público apoiará satisfeito as novas tecnologias.

Mas a natureza da informação disponível ao público também é importante e esses estudos sugerem que cientistas podem se esforçar mais para transmitir a informação de forma a esclarecer pessoas com valores diferentes, ao invés de simplesmente reforçar seus preconceitos.

Tradução: Amy Traduções

Richard Jones

Nature

26/12/08

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